ALMA DO MORRO

Celeste Aída de Assis Foureaux

Fui menino do morro
Não tinha sapato,
Sonhava com ele,
Andava descalço.
Desci pra cidade
Para a vida tentar,
Fazia biscates e...
Não tinha sapato.
Um dia ganhei
Um par de sapatos;
Com ele fiquei
Mostrei a todo mundo:
Ó... eu de sapato!
Com um largo Sorriso
Andava, corria,
E a vida a passar.
E todos passavam,
Calçados ou não,
O mundo girando,
E eu ... de sapato!
Sapato pesado!
Talvez como a vida...
Mas dava guarida
Pros meus pobres pés.
- Prefiro descalço! -
Dizia cansado,
Mas tinha que usar!
Já estava pequeno
Pros meus grandes pés,
E eu... de sapato!
Apertava, doía,
Furava, sujava,
Eu clamava, chorava
Mas tinha cuidado
Com minha aparência.
Um dia, era novo
O tal do sapato;
Andei dia todo
Fui ver documentos
Que pés doloridos!
O sol a queimar,
Dois grandes buracos
Nos meus calcanhares!
Voltei sem dinheiro
E sem documentos
Por pura maldade
Da burocracia,
Essa velha corcunda,
Que corrói o país!
Depois de uma fila
E de ser maltratado,
Mancando pensava:
Que mundo mais “cão”!
E eu... de sapato!
A vida passou,
Voltei lá pro morro,
lutei, trabalhei,
Montei minha casa
E assim fui vivendo.
Mas veio o toró
E puxou meu barraco
Em cima de mim,
Matou muita gente
E veio o bombeiro
Cumpriu sua parte,
Cobriu com uma lona,
Os pés para fora...
E os meus ... de sapato!


Celeste – Fevereiro 1999

Envie este Poema

De: Nome: E-mail:
Para: Nome: E-mail:
Sinceros agradecimentos pela preservação da Autoria.